21/04/2018

Entrevista para revista portuguesa Versus Magazine.

- De onde surgiu a ideia de formar os Pandemmy? E qual o significado deste nome?

Pedro Valença: Quando eu estava aprendendo a tocar guitarra, logo perdi o interesse em tirar covers pelo gosto em compor meus próprios riffs. O Pandemmy se originou na minha experiência na banda Monstera, que fiz parte por um ano e tinha uma levada mais thrash. Quando decidi sair, busquei membros para um projeto com mais death metal na sonoridade. Sobre o nome, eu pensava em algo que desse a ideia de abrangência, seja na sonoridade que transita entre o death e o thrash metal, seja nos temas das letras. Em inglês, ‘Pandemic’ significa pandemia, uma enfermidade amplamente disseminada, em nosso caso, a vontade de disseminar nossa música.

- Desde 2009, quando os Pandemmy surgiram, a banda sempre teve elementos de thrash e death metal. Porém, o grupo evoluiu ao longo destes nove anos e teve algumas mudanças de formação. Quais eram as influências musicais no início e quais são as influências mais atuais?

Pedro Valença: Eu diria que na época da demo ‘Self-Destruction’ e do EP ‘Idiocracy’ nosso som era bem cru, ríspido. Resgatamos um pouco disso na mixagem do álbum ‘Reflections & Rebellions’. Hoje trabalhamos um pouco mais nas composições sem perder a agressividade. Por mais curioso que seja, as mudanças de formação não alteraram as influências em comum. Carcass, Kreator, Morbid Angel, Megadeth, Sepultura e o Torture Squad são nossas influências principais. Obviamente, cada integrante tem suas preferências que fazem diferença nas composições e arranjos das nossas músicas. O nosso objetivo é trabalhar cada vez mais nossa identidade musical, evoluindo sempre, sem barreiras. Outra característica nos nossos álbuns é a sequência das músicas, que trabalhamos para que não soem repetitivas.

- Viver o underground do heavy metal não é fácil em lado nenhum. Muitas bandas sobrevivem às custas da dedicação abnegada de seus músicos. No Brasil não é diferente. Quais foram e são as maiores dificuldades enfrentadas pelo Pandemmy?

Marcelo Santa Fé: Eu poderia chegar aqui e dizer que as maiores dificuldades não só para o Pandemmy, mas para a maioria das bandas brasileiras são a falta de espaço para tocar, falta de contato com pessoas influentes de outros lugares para fechar shows, a dificuldade em encontrar algum selo para lançar seu material além das fronteiras do seu estado ou país. Porém, a maior dificuldade que uma banda pode ter é a falta de vontade dos membros. Muita gente acha que pagar ensaio é estar comprometido o suficiente. Gerir uma banda como um projeto sério é algo muito complexo, exige constantemente a participação efetiva de todos os membros nas mais diversas funções, principalmente se o grupo não dispõe de recursos financeiros para contratar pessoas e serviços. Se você jogar nas costas de apenas uma pessoa atribuições como composição de músicas e letras, cuidar das mídias sociais, fazer contatos, produção, distribuição de material, gerenciamento de merchandising e demais atividades, essa banda fatalmente, vai acabar.
- O Pandemmy passou por diversas mudanças de formação. Por quê? Essa é outra dificuldade que vocês encontram em vossa carreira?

Pedro Valença: A banda começou com quatro integrantes bem jovens. E com o passar dos primeiros anos, muita coisa influenciou. A forma de pensar e agir diante de algumas dificuldades no underground, a maturidade, as prioridades pessoais. Existiram conflitos que quebraram o clima para alguns membros. Eu como líder e fundador da banda também errei em algumas situações. Olhando ao redor, é uma realidade do underground até as bandas que estão no mainstream do Heavy Metal. Por sermos um quinteto, acho que estamos mais expostos a esses acontecimentos. Atualmente, estamos muito bem, coesos em palco e com um relacionamento bem objetivo no backstage.

- Nas vossas letras nota-se a consciência social e política de músicos que usam sua arte como forma de manifestar suas opiniões e denúncias. Qual é a vossa visão do momento delicado que o Brasil vive, da ameaça cada vez mais grave e real à frágil democracia brasileira?

Pedro Valença: Primeiramente nós lamentamos a distância que as bandas de Metal Nacional criam com os assuntos políticos. Em locais que as pessoas tem mais consciência política, vemos o apoio de governos no fomento de projetos ligados a bandas e festivais. Particularmente, o RAP me influencia mais na instiga de escrever sobre temas como o preconceito, democracia, justiça. Sobre o Brasil, eu custei a acreditar que vivenciei um golpe de estado. Achava que eram práticas passadas, dos livros de história. O que resta é se mobilizar, apesar de doloroso, sabemos que esse ciclo conservador e opressor terá um fim.

Marcelo Santa Fé: Nota-se que a democracia de um país está em estado crítico, quando uma grande parcela da população vai às ruas pedir por intervenção militar, quando uma presidente eleita pelo voto do povo sofre um golpe, veementemente repudiado pelas  nações mais democráticas do mundo, quando professores de história são chamados de doutrinadores comunistas. Eis que armamentistas, homofóbicos e misóginos se tornam "mitos".

Guilherme Silva: A atual situação da democracia brasileira é alarmante! A falta de consciência social e política dos brasileiros é a grande culpada de estarmos neste péssimo momento. Dentro da cena Metal, por exemplo, vemos inúmeras vezes, headbangers apoiando discursos consevadores de políticos da extrema direita, o que não fazer sentido algum apoiar o conservadorismo dentro da música extrema, visto que a música pesada se contrapõe ao status quo e aos padrões impostos pela sociedade. Achamos extremamente necessário posicionarmo-nos politicamente contra estes ideais.

- Vocês já se apresentaram em festivais como Roça N’ Roll, Abril Pro Rock, Hellcifest e dividiram palcos com grandes nomes da música pesada mundial. Qual a importância destes momentos para a vossa trajetória e formação como músicos e banda?

Pedro Valença: É sempre uma oportunidade de trocar contatos e observar como as bandas trabalham no backstage e daí como podemos melhorar. Muitas vezes as bandas gringas gostam de conhecer o material das bandas dos locais que eles tocam, e na maioria os músicos de fora são bem receptivos. Dividir palco com essas bandas agrega valor e experiência para quem está no underground, abre portas e aumenta a divulgação.
- Como é o processo criativo da banda? Quem é o responsável pelas composições das músicas e letras?

Pedro Valença: Eu e Guilherme dividimos a função de compor as músicas. Juntamos nossos riffs, fazemos uma bateria programada por cima e depois levamos pro estúdio de ensaio para adicionar e modificar arranjos.  Sempre há contribuição de todos os membros nesse processo. Como estou sempre pensando nas propostas líricas da banda, escrevo as letras também e Rayanna cuida da execução do vocal.

- Em “Rise Of A New Strike” há dois covers. Um da música “Ecce Hommo”, da banda pernambucana de death metal Decomposed God. O outro é dos Sentenced, “Nephente”. Por que o Sentenced?

Pedro Valença: Estamos num momento de despedidas com nossos ídolos. Todos os anos perdemos artistas que nos marcaram. Muitas bandas também estão em suas ultimas turnês, como recentemente anunciou o Slayer e o Manowar. O Sentenced é uma das bandas preferidas dos atuais membros do Pandemmy, e além de uma homenagem sabemos que é muito improvável o retorno deles depois da morte do guitarrista Mika Tenkula.

- Entre 2009 e 2017 os Pandemmy sempre tiveram vocalistas masculinos. Como foi o processo de escolha da Rayanna Torres e o que vos levou a optar por uma mulher para assumir os vocais do grupo?

Pedro Valença: A entrada de Rayanna foi aos quarenta e cinco do segundo tempo. Já estávamos praticamente certos com um vocalista masculino. Ela foi a última a fazer o teste e nos surpreendeu. Não tínhamos a proposta de optar apenas por uma vocalista mulher. Ela simplesmente chegou no ensaio e cantou três músicas com bastante instiga, nos convencendo sobre o posto de vocalista. Não vamos negar que chama mais atenção uma mulher como frontwoman, mas sabemos do talento dela e dos nossos esforços em produzir boas músicas.

- Ouvindo o álbum “Rise Of A New Strike” é possível perceber que algumas canções, embora gravadas por um vocal masculino, encaixam-se muito bem nas linhas vocais femininas, com alguma influência, por exemplo, de Arch Enemy. Vocês pensam em lançar um álbum com regravações de músicas antigas?

Pedro Valença: Sim! Uma coletânea com regravações de algumas faixas antigas e algumas faixas nunca utilizadas, está dentre os nossos desejos. Rayanna regravou algumas faixas do “Rise Of A New Strike” para alguns vídeos que iremos lançar até o fim deste ano. O videoclipe da faixa “Circus Of Tyrannies” já conta com os vocais dela.
- Na sequência da pergunta anterior, quais são os planos futuros dos Pandemmy?

Pedro Valença: Estamos trabalhando em um Lyric Video para a faixa Almost Dead e um single a ser lançado até o mês de junho. O single será uma faixa inédita, cujo tema é a opressão que a Palestina sofre nas mãos do estado israelense. Em dezembro, iremos lançar digitalmente, a princípio, um Split com uma banda italiana. Serão cinco faixas: uma intro, três inéditas e um cover. Em breve divulgaremos mais detalhes sobre este lançamento. O próximo álbum de inéditas do Pandemmy ganhará vida apenas no segundo semestre de 2019.

- Os vossos trabalhos se encontram disponíveis nas plataformas de streaming. Mas, pensam em lançar algo no mercado europeu? Alguma vez foram procurados por alguma editora europeia?

Pedro Valença: Já tivemos contato com uma gravadora europeia, mas a proposta não era vantajosa para o Pandemmy. Ainda em 2018, vamos ver a possibilidade de colocar o álbum “Rise Of A New Strike” em alguns pontos de vendas no continente Europeu.

- Agradeço pela entrevista. Deixo este espaço para uma última mensagem.

Pedro Valença: Nós gostaríamos de agradecer pelo espaço cedido, foi uma das nossas melhores entrevistas. Quem quiser conhecer as nossas músicas, estamos presentes nas principais plataformas de streaming, incluindo os álbuns completos no YouTube, além das novidades que postamos nas nossas redes sociais no Facebook e Instagram.
It’s time to spread the Pandemmy again !!!

5 perguntas para a Rayanna Torres
- Vivemos em uma sociedade desigual, excludente e de dominação masculina. As mulheres têm que lutar muito mais para conquistarem seus espaços. Na cena heavy metal, infelizmente, não é diferente. O machismo ainda se faz sentir presente no nosso cenário. Como tem sido a tua experiência como headbanger e artista?

Rayanna Torres: Ainda temos que discutir sobre o machismo no Metal. Particularmente eu acho um saco ter que falar disso ao invés de falar SÓ DO MEU SOM, como quando homens são entrevistados, infelizmente. Já aconteceram várias situações chatas comigo, desde gritos de homens nojentos enquanto estou no palco, até "Você canta igual um homem" e "Você não canta gutural" dentre vários outros comentários. Uma vez estava tocando com a Vocifera e tivemos o desprazer de escutar "Eu não acredito que uma banda só de meninas toca Death/Thrash. Eu escutei o disco e tenho certeza que são outras pessoas tocando"... FOI FODA!

- Antes de integrares os Pademmy, fizeste parte das Vocífera, uma banda de death/thrash metal do Recife que era formada apenas por mulheres. Como surgiu o convite para entrares na Vocífera e como foi essa experiência?

Rayanna Torres: Amigos em comum. Dois amigos tinham comentado comigo que a Vocífera estava sem vocalista e outro amigo disse para Marcella Tiné (baterista da Vocífera) que me conhecia. Então entrei em contato com elas e fiz o teste. Logo após começamos ensaiar e gravar o disco. Foi bem legal!

- E os Pandemmy, como foi o processo para a tua entrada?

Rayanna Torres: Foi praticamente a mesma coisa. Um amigo me disse que os meninos estavam sem vocalista, eu entrei em contato com eles e fiz o teste.

- No cotidiano da cena (viagens, festivais/concertos, estúdios, etc.), notas alguma diferença na forma como fãs, produtores e afins tratam os Pandemmy, em que és a única mulher, em comparação às Vocífera, em que eram todas mulheres?

Rayanna Torres: Querendo ou não, sabemos que o tratamento é um pouco diferente. As vezes a galera "pira" por ser uma mulher no vocal, pede pra tirar foto e me tratam super bem. Outras vezes é bem diferente ... Não acham que sou capaz por ser uma garota, mas na maioria dos casos eu sou bem recebida e respeitada pelos produtores, caras de outras bandas e público. Entre os amigos eu nunca fui desrespeitada para falar a verdade. É massa! No Vocifera eu sentia muito mais o machismo. Alguns não acreditavam que cinco mulheres podem fazer metal. Foda-se!

- Quais são as tuas principais referências?

Rayanna Torres: Eu curto muito Death e Thrash Metal, então minhas principais referências são: Death, Suffocation, Cannibal Corpse, Obituary, Kreator, Krisiun, Slayer e Dying Fetus. E algumas bandas com meninas tipo Cerebral Bore, Torture Squad e Arch Enemy.

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